SERMÃO DE SANTO ANTÔNIO: O cuidado solícito do Bom Pastor pelas ovelhas

Acompanhe um trecho do sermão de Santo Antônio no Terceiro Domingo da Pascoa onde fala sobre o cuidado que Cristo tempo nós, que somos o seu povo e as ovelhas de sua pastagem: Eu sou o bom pastor. O sermão segue com o sermão alegórico e moral falando sobre Cristo e sobre o prelado da Igreja.

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24.10.2023 13:42:28 | 19 minutos de leitura

SERMÃO DE SANTO ANTÔNIO: O cuidado solícito do Bom Pastor pelas ovelhas

3. "Eu sou o bom pastor.? Com justiça, Cristo pode dizer: "Eu sou", porque para ele nada é passado, nada é futuro, mas tudo é presente. De fato, diz no Apocalipse: «Eu Sou O Alfa e o Ômega, o princípio e o fim, diz o Senhor Deus, que é, que era e que sal de vi, o Onipotente (Ap 1,8); c no Êxodo: "Eu sou. Assim dirias aos filhos de Israel: Eu sou" me manda a vós" (Ex 3,14). Portanto, muito bem se diz: "Eu sou o bom pastor". 

Pastor deriva de pasco, pascis (apascentar, pastorear, nutrir), e Cristo nos nutre cada dia com sua carne e seu sangue no sacramento do altar. Diz Isa Jessé, pai de Davi) no Primeiro livro dos Reis: "Ainda falta um pequeno, que anda apascentando as ovelhas" (1Sm 16,11). O nosso Davi, pequeno e humilde, apascenta como um bom pastor. Ele é o nosso Abel que, como se lê no Gênesis, foi pastor de ovelhas (cf. Gn 4,2): o fratricida Caim, isto é, o povo judaico, matou-o por ódio.

Desse pastor, o Pai diz: Suscitarei um pastor que apascentará o meu rebanho, Davi meu servo", isto é, meu filho Jesus; ele mesmo apascentará e será o seu pastor" (Ez 34,23). E em Isaías: "Ele apascentará como um pastor o seu rebanho: nos seus braços recolherá os cordeiros e os tomará no seu peito; ele mesmo levará as ovelhas que amamentam" (Is 40,11). Fala como bom pastor aquele que, quando conduz o seu rebanho para o pasto e o faz voltar, recolhe com seu braço os cordeiros pequenos que não podem caminhar, e ergue ao peito as ovelhas que amamentam (latim: fetas) e aquelas cansadas, ele próprio as carrega. O termo latino fetus (fecundado), às vezes significa "cheio", às vezes "libertado"

Assim Jesus Cristo nos apascenta cada dia com os ensinamentos evangélicos e com os sacramentos da Igreja; reuniu-nos com seu braço, estendido sobre a cruz. Diz João: "Para unir num só corpo os filhos de Deus, que estavam dispersos" (Jo 11,52). "E os erguerá ao seu peito", erguer-nos-á ao seio de sua misericórdia, como faz a mãe com o filho. Diz, de fato: "Eu fiz de aio (nutritus) a Efraim, carreguei-o nos meus braços" (Os 11,3). Ele nos nutre com seu sangue, como com leite. No seio, ou sob o seio, foi ferido por nós pela lança no Monte Calvário, para oferecer-nos seu sangue, como a mãe oferece ao filho o leite; e nos carregou nos seus

4. Por isso, na epístola de hoje Pedro diz: "Ele mesmo carregou os nossos pecados em seu corpo sobre o madeiro, para que, mortos para os pecados, vivamos para a justiça; por suas chagas fostes curados" (1Pd 2,24).

"E ele carrega as grávidas", isto é, as almas grávidas dos penitentes, herdeiros da vida eterna. De fato, diz no Êxodo: "Vós mesmos vistes o que eu fiz aos egípcios, de que modo vos trouxe sobre asas de águia, e vos tomei para mim" (Ex 19,4). Ele afunda os egípcios, isto é, os demônios e os pecados mortais, no Mar Vermelho, quer dizer, na amargura da penitência, das lágrimas e do sofrimento banhado e avermelhado pelo sangue; carrega, então, os penitentes sobre asas de águia, quando, desprezadas as coisas terrenas, ergue-os para as coisas celestes para que com olhos límpidos contemplem o sol de justiça. Com razão, pois, diz: "Eu sou o bom pastor". E Davi: "Tu és bom, e por tua bondade me ensinas" (SI 118,68), ovelha errante. "Andei errante, como ovelha que se desgarrou" (SI 118,176). E no Livro da Sabedoria: "Ó quão bom e suave é, Senhor, em tudo o teu espírito!" (Sb 12,1).

"O bom pastor dá sua vida por suas ovelhas" (Jo 10,11). Põe em evidência aquilo que é próprio e exclusivo do bom pastor, dar a vida por suas ovelhas: o que fez Cristo. Diz Pedro na epístola de hoje: "Cristo sofreu por nós, deixando-vos um exemplo, para que sigais suas pegadas" (1Pd 2,21). Comenta a Glosa: Alegra-te porque Cristo morreu por ti. Mas presta atenção ao que segue: "Deixando-vos um exemplo" de ultrajes, de tribulações, de cruz e de morte.

"O bom pastor, pois, dá a vida por suas ovelhas." E destas diz sempre Pedro no fim da epístola: "Éreis como ovelhas desagarradas, mas agora vos convertestes 20 pastor e bispo (latim: episcopus) de vossas almas" (1Pd 2,25). Que imensa misericórdia! Proclama-o o introito da missa de hoje: "Da misericórdia do Senhor está cheia a terra!" "Da palavra do Senhor tiveram estabilidade os céus" (SI 32,5-6), isto é, do Filho de Deus tiveram estabilidade os apóstolos e os homens apostólicos, para não serem como ovelhas errantes, mas permanecerem sempre sob a vara do pastor e bispo das almas.

5. As ovelhas pelas quais o bom pastor Jesus Cristo deu sua vida, representam as sete igrejas das quais fala o trecho do Apocalipse: "Ouvi por trás de mim - diz João - uma grande voz, como de trombeta, que dizia: o que vês, escreve-o num livro e envia-o às sete Igrejas que há na Ásia: a Éfeso, a Esmirna, a Pérgamo, a Tiatira, a Sardes, a Filadélfia e a Laodiceia. Voltei-me para ver a voz que falava comigo e, voltando-me, vi sete candelabros de ouro; no meio dos sete candelabros de ouro, um homem semelhante ao Filho do homem, vestido de hábito talar e cingido pelo peito (ao seio) com um cinto de ouro; a sua cabeça e os seus cabelos eram brancos como a lá branca e como a neve, os seus olhos como uma chama de fogo, os seus pés eram semelhantes ao bronze fino, quando está numa fornalha ar. dente, e a sua voz como o ruído de muitas águas; tinha na sua direita sete estrelas, cala da sua boca uma espada de dois fios, e o seu rosto resplandecia como o sol em toda a sua força" (Ap 1,10-16).

Explicaremos este trecho primeiramente em sentido alegórico, aplicando-o a Cristo, e depois em sentido moral, aplicando-o ao prelado da Igreja.

Sentido alegórico. Éfeso interpreta-se "minha vontade" ou "meu conselho?; Es-mira, *O seu canto?; Pérgamo, "que divide os chifres" ou "que seca o vale"; Tiatira, "luminada?; Sardes, "princípio da beleza"; Filadélfia, "que preserva" ou "que salva quem se apega ao Senhor®; e, enfim, Laodiceia que quer dizer "tribo amável", "as sete candelabros de ouro" representam todas as igrejas, ardentes e iluminadas pela sabedoria do Verbo divino. Como o ouro refinado pelo fogo e batido é transformado num candelabro, assim a Igreja, purificada pelas tribulações e batida pelos golpes das perseguições, aperfeiçoa-se e se difunde até os países mais distantes.

"Em meio aos sete candelabros de ouro", isto é, na comunidade de todas as Igrejas - pois em todas as Igrejas Deus está presente e está sempre pronto a vir em socorro - «vi um homem semelhante ao filho do homem", mas só semelhante, porque já não morre; ou semelhante ao filho do homem, porque não foi sujeito ao pecado, mas tomou só a semelhança da carne de pecado. "Vestido com a túnica talar" , sacerdotal, isto é, da veste da carne, na qual se ofereceu e cada dia se oferece, apresentando a si mesmo ao Pai. "E cingido ao peito com uma cinta de ouro", isto é, a cinta da carida-de, em virtude da qual se entregou à morte por nós.

"Sua cabeça e seus cabelos eram brancos como a lá branca e como a neve." A cabeça é a divindade. Diz o Apóstolo: "Cabeça de Cristo é Deus" (1Cor 11,3). A cabeça representa também o próprio Cristo, que é cabeça da Igreja (cf. Ef5,23); nele existe tudo aquilo que é necessário ao governo da própria Igreja. Os cabelos representam os fiéis, que estão unidos firmemente à própria cabeça. Portanto, a cabeça e os cabelos, isto é, Cristo e seus cristãos, são brancos como lá branca pela simplicidade e pela pureza, e como a neve, pelo candor da imortalidade, pois como ele vive, também nós viveremos com ele (cf. Jo 14,19).

"E os seus olhos eram como uma chama de fogo." Os olhos indicam o olhar da raça de Jesus Cristo, que derrete o coração enregelado do pecador, como a chama fogo dissolve o gelo. Assim o Senhor olhou para Pedro com os olhos da miseriórdia, e Pedro chorou amargamente (cf. Ic 22,61-62) porque o gelo do seu coração se derreteu em lágrimas de compunção. "E os seus pés", isto é, os pregadores, que o levam ao mundo todo, eram "semelhantes ao bronze fino (latão), não um latão qualquer, mas aquele purificado "na fornalha ardente". O latão é assim chamado porque tem semelhança tanto com o ouro como com o bronze: de fato, o bronze em grego chama-se chalkòs. No ouro é indicado o esplendor da sabedoria, no bronze, a sonoridade da eloquência. Os pés de Jesus Cristo são semelhantes ao latão porque os pregadores devem resplandecer pelo fulgor da sabedoria e pela sonoridade da eloquência.

"E a sua voz era como a voz de muitas águas." A pregação de Cristo possui a virtude da água, porque lava. De fato, aos apóstolos ele disse: "Vós estais limpos em virtude da palavra que vos anunciei" (Jo 15,3). Já são muitos os povos que acolhem a voz de Jesus Cristo, e são comparados às águas por causa do fluir da vida e da morte. Ou também, "a sua voz, como a voz de muitas águas", isto é, que faz brotar muitas águas, que dá muitas graças. Por isso continua: "E tinha na sua direita sete estrelas", isto é, as sete graças, os sete dons do Espírito Santo, que segura na sua direita, assim chamada porque dá fora (dat extra): de fato, do tesouro de sua munificência dá as graças a quem quer, quando quer e como quer. Ou também, as estrelas representam os bispos, que devem resplandecer diante a todos com a palavra e com o exemplo: e o Senhor os segura na sua direita, isto é, considera-os os seus dons maiores, representados precisamente pela mão direita.

"E de sua boca saía uma espada de dois fios." De sua boca, isto é, do seu comando, saiu a pregação, que corta dos dois lados: no Antigo Testamento as obras carnais, no Novo, as várias concupiscências.

"E seu rosto era como o sol quando resplandece em toda a sua força." O rosto de Cristo são os dignos prelados da Igreja e todos os santos, por meio dos quais, como por meio do rosto, conhecemos a Cristo. Estes resplandecem como o sol em toda a sua força, isto é, ao meio-dia, sem nuvens; ou quando o sol estiver parado na eternidade, eles resplandecerão assim, quer dizer, tornar-se-ão semelhantes ao verdadeiro sol, Jesus Cristo.

6. Sentido moral. "Eu sou o bom pastor." Bem-aventurado o prelado da Igreja que pode dizer com toda a sinceridade: Eu sou o bom pastor. Por ser homem, é necessário que ele seja semelhante ao Filho do homem, e esteja no meio de sete candelabros de ouro. Deles diz João: "Vi sete candelabros de ouro": neles são indicadas as sete qualidades necessárias ao prelado da Igreja: inocência de vida, ciência da Sagrada Escritura, eloquência de palavra, assiduidade na oração, misericórdia para com os pobres, disciplina em relação aos súditos, cuidado solícito pelo povo que lhe é confiado. Estes sete candelabros encontram correspondência no significado das sete igrejas.

Éfeso interpreta-se "minha vontade", ou "meu conselho". Aqui é indicada a inocência de vida, da qual diz o Apóstolo: "Esta é a vontade de Deus, a vossa santificação: que cada um de vós saiba possuir o seu corpo em santidade e honra" (11s 4,3-4). E Isaías: "Dá um conselho, toma uma decisão" (Is 16,3). Dá um conselho para viver na inocência em relação à alma; toma uma decisão, isto é, freia os cinco sentidos, para viver na castidade no que se refere ao corpo.

Esmirna interpreta-se "o seu canto". E aqui é indicada a ciência do conhecimento das Sagradas Escrituras. Diz o profeta: "Cantai ao Senhor um cântico novo" (SI 95,1). Todas as ciências mundanas e lucrativas são o cântico velho, o cântico da Ba-bilônia. Só a teologia é o cântico novo, que ressoa suavemente aos ouvidos de Deus e renova o espírito. Ela deve ser o cântico dos prelados. Se não existir em Israel um ferreiro - diz o Primeiro livro dos Reis - não deve causar admiração se os filhos de Israel deviam ir aos filisteus para afiar o arado, a enxada, o machado e o sacho (cf. 1Sm 13,19-20). Mas, graças a Deus, em Israel, isto é, na Igreja, existe, não digo um ferreiro só, mas existem muitos ferreiros, isto é, muitos teólogos, que sabem afiar o arado, a enxada, o machado e o sacho e repará-los perfeitamente. O vômer é chamado assim porque escava a terra, ou também porque vomita terra; a enxada (latim: ligo) porque levanta a terra; o machado (latim: securis) porque corta (latim. sacidio as árvores; o sacho é um utensílio de ferro munido de cabo, instrumento inecessário no cultivo dos campos. Com estes utensílios de trabalho é indicada a pra rica da pregação, que escava o humus da cobiça e a terra da iniquidade, convence a mente a desprezar as atrações destes vícios, corta os ramos secos da árvore infrutífera e cultiva o campo da Igreja militante.

Porque, pois, os filhos de Israel, isto é, os prelados da Igreja, devem ir aos filisteus, nome que se interpreta "caídos completamente embriagados", isto é, entregam-se às ciências lucrativas? E recorrem a eles para ineriar-se com a bebida de uma dignidade efêmera, da gula e da luxúria, com a ambição da vanglória e do dinheiro, e assim embriagados, caem nas profundezas do inferno. A estes diz Bernardo: " ambição verdadeiramente infeliz, que não sabe aspirar às grandes coisas: de fato, desejam os primeiros lugares, mas deve-se temer que eles caiam como figos que não amadureceram. Cuidem-se bem aqueles que desejam os primeiros lugares, para não perder também os segundos, e acabem depois por precipitar-se vergonhosamente no último lugar do inferno".

Pérgamo interpreta-se "que quebra os chifres" (a arrogância), ou "que seca o vale». Aqui é representada a eloquência da língua erudita, que quebra os chifres dos soberbos e seca o vale dos carnais. Daí que o Senhor diz por boca do profeta: "Quebrarei todos os chifres (a arrogância) dos pecadores" (SI 74,11). E Jó: "Poderás, porventura, prender o rinoceronte com a rédea para fazê-lo arar, ou para que ele quebre os torrões dos vales atrás de ti?" (Jó 39,10). O rinoceronte é um animal rude, semelhante a um cabrão [sic], que sobre as narinas tem um chifre exageradamente pontudo: representa o Bem-aventurado Paulo, que lançando ameaças e massacres, enquanto ia para Damasco, foi amarrado com a rédea do poder divino para arar, isto é, para pregar. De fato, o Senhor disse a Ananias: "Este é para mim um vaso de eleição [instrumento escolhido] para levar o meu nome diante dos gentios (pagãos), dos reis e dos filhos de Israel" (At 9,15). Ele quebrou os torrões dos vales, quer dizer, as mentes dos carnais e dos infiéis, com o arado da pregação.

Tiatira interpreta-se "iluminada". Simboliza a assiduidade na oração, que ilumina a mente. Lemos no Apocalipse: "A claridade de Deus a ilumina e a sua lâmpada é "Cordeiro" (Ap 21,23). No cordeiro estão representadas a inocência e a simplicidade, duas virtudes necessárias de modo particular a quem reza: como claridade e lâmpada elas iluminam a mente de quem é assíduo na oração.

Sardes quer dizer "princípio de beleza". E esta é a misericórdia para com as pobres, que expulsa a lepra da avareza e torna bela a alma. De fato, é dito: "Dai es mola..., e eis, que para vós tudo será puro" (Lc 11,41).

Filadélfia interpreta-se "que preserva ou salva quem adere ao Senhor". Aqui é representada a correção em relação aos súditos, que preserva quem adere ao Senhor no seu serviço, e salva do perigo da morte. A propósito disso diz o Apóstolo: "Toda correção no presente não parece um motivo de gozo, mas de tristeza; depois, porém, dará um fruto de paz e de justiça aos que por ela foram exercitados" (Hb 12,11).

Laodiceia interpreta-se "tribo amável" pelo Senhor. E aqui é representada a Igreja católica do povo cristão, sobre a qual o prelado deve vigiar com cuidado assíduo. Do amor por ela, diz João: "Tendo amado os seus, que estavam no mundo, amou-os até o fim" (Jo 13,1), quer dizer, amou-os tanto que o amor o conduziu até a morte.

Estes são os sete candelabros que iluminam todas as igrejas reunidas pelo Espírito da septiforme graça, em meio às quais o prelado, semelhante ao Filho do homem, isto é, a Jesus Cristo, deve caminhar na pobreza, na humildade, na obediência, vestido com a túnica branca. A túnica é a túnica talar, a túnica de linho vestida por Aarão, e que está a significar a castidade do corpo, à qual deve estar unida a pureza do coração.

7. "Estava cingido ao peito com um cinto de ouro." Daniel viu o personagem cingido nos rins, nos flancos, porque no Antigo Testamento eram condenadas as obras carnais; João o viu cingido no peito (nos seios), porque no Novo Testamento são julgados também os pensamentos. Portanto, com um cinto de ouro, isto é, com o amor a Deus, é amarrado o peito (são amarrados os seios), quer dizer, é reprimido o fluxo dos maus pensamentos.

Depois continua: «Sua cabeça e seus cabelos eram brancos como lá branca e como a neve". A cabeça é assim chamada enquanto compreende todos os sentidos, e está a indicar a mente que é como que a cabeça da alma; e os cabelos representam os pensamentos. Na mente costuma residir a impureza e o estímulo do pecado. Portanto, a mente e os pensamentos devem ser cândidos como a lá branca contra a imundície do pecado, e como a neve contra o seu estímulo.

"E seus olhos eram como uma chama de fogo." Os olhos do prelado representam a contemplação de Deus e a compaixão pelo próximo, que devem ser como uma chama de fogo: isto é, devem irradiar confiança em relação a Deus e inocência em relação ao próximo.

"E seus pés eram semelhantes ao latão." Os pés representam os afetos da mente e os efeitos das obras. Destes dois pés ficou coxo Mifiboset - nome que se interpreta "homem de confusão" -, ao cair dos braços da ama, como se narra no Segundo livro dos Reis (cf. 2Sm 4,4). Nele vemos representado o pecador, homem da confusão eterna, que, por causa do pecado mortal, caiu dos braços da ama, isto é, sai da graça do Espírito Santo, e se torna coxo de ambos os pés. Os pés do bom prelado, porém, devem ser semelhantes ao latão. O latão, como se disse, tem a cor do ouro e do bronze: no ouro está simbolizado o afeto da mente, no bronze, a ressonância (o exemplo) das boas obras. Com frequência, o latão é abrasado e assim melhora a sua cor; da mesma forma o bom prelado: quando mais for queimado pelo fogo da tribulação, tanto mais se torna luminoso.

"E a sua voz era como a voz de muitas águas." Como muitas águas que correm impetuosamente arrastam qualquer obstáculo, assim a voz da pregação do prelado deve arrastar qualquer obstáculo de vícios e qualquer impedimento que se entrepõe à salvação das almas.

"E na sua direita tinha sete estrelas." As sete estrelas são as sete glorificações do corpo e da alma. As da alma são: a sabedoria, a amizade, e a concórdia; as do corpo são: a luminosidade, a agilidade, a subtileza (a compenetração) e a imortalidade. O prelado deve ter estas qualidades na direita, para que tudo o que pensa, tudo o que faz, tudo seja destro, isto é, reto, e para que possa ter na direita da vida eterna as sete estrelas, isto é, seja posto à direita com suas ovelhas.

"E de sua boca saía uma espada de dois gumes." A espada é a confissão, que deve estar afiada de ambos os lados para poder cortar os vícios espirituais, que são a soberba e a vanglória, e os vícios carnais, que são a avareza, a gula e a luxúria.

"E o seu rosto era como o sol quando resplandece em todo o seu fulgor." O rosto do prelado são suas obras, por meio das quais, como pelo rosto, ele é reconhecido. "Reconhecê-los-eis pelos frutos" (Mt 7,16). Se os frutos são bons, resplandecerão como o sol em todo o seu fulgor. De fato, diz o Senhor: "Resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem o vosso Pai que está nos céus" (Mt 5,16). Se o prelado for assim, em consciência poderá dizer: "Eu sou o bom pastor"

Irmãos caríssimos, peçamos ao Senhor nosso Jesus Cristo que conceda ao pastor de sua Igreja a graça de apascentar como convém o rebanho dos fiéis e, no fim, mereça chegar a ele, que é a eterna pastagem dos santos. Conceda-o aquele que é bendito nos séculos dos séculos. Amém.

Fonte: Sermões | Santo Antônio; tradução de Frei Ary E. Pintarelli, OFM: Vozes, 2019
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