PERDÃO DE ASSIS: A regra é a Misericórdia
No dia em que celebramos o dia do Perdão de Assis e em meio a celebração do oitavo centenário da Regra Bulada, Frei Roberto Alves convida a reflexão a cerca da misericórdia como uma das bases da regra de vida franciscana
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02.08.2023 12:53:11 | 1 minutos de leitura

A Família Franciscana celebra neste dia 2 de agosto a Festa do Perdão de Assis e o dia de Santa Maria dos Anjos. Segundo a tradição, foi em uma Igrejinha dedicada a Virgem Maria que no ano de 1216, durante uma noite, em sua cela, Francisco rezava pela conversão dos pecadores, quando sendo inspirado por um anjo a dirigir-se à Capela da Porciúncula, encontrou-a toda iluminada e no meio de um coro de anjos estava a Virgem Maria ao lado de seu Divino Jesus. Jesus, dirigindo-se a Francisco, disse-lhe: “Em recompensa ao teu zelo pela conversão dos pecadores, pede-me o que quiseres”. Francisco pediu-lhe então a indulgência Plenária para todos aqueles que tendo confessado e comungado, visitassem aquela pequena igrejinha. São Francisco, meio que assustado com seu atrevimento, suplicou a intercessão da Virgem Maria. O pedido teria que ser aprovado pelo Papa, o que foi concedido pelo mesmo para dia 2 de agosto.
O desejo profundo do jovem Francisco de levar todos ao Paraíso, encontrou sempre eco em toda sua vida. O homem "misericordiado" só poderia agir com misericórdia. Diante dos seus encontros feitos e ao se deixar encontrar possibilitou que ele mesmo alcançasse uma liberdade interior a ponto de espalhar o amor de Deus com todos os que estavam ao seu redor. Ao celebrar neste dia, a Festa do Perdão de Assis, somos convidados (as) a olhar para a vida deste santo e buscar traçar os nossos passos a partir da misericórdia. Todos sabemos dos receios que existiam no coração de Francisco sobre escrever uma regra jurídica para aqueles que no início foram identificado como "penitentes de Assis", pois o santo tinha grande medo do carisma ser sufocada por letras e formas que sem o espírito é morta. Mas na busca de tentar manter vivo o carisma inicial escreveu vários outros textos como cartas, bilhetes e admoestações que nos dão sinalizações daquilo que de fato o mesmo queria para a sua fraternidade e que vamos destrinchar um pouco a seguir.
Indo às fontes dos textos franciscanos escritos pelo santo, tocaremos na essência do desejo que o mesmo queria que seus irmãos vivessem profundamente a misericórdia e estes nos ajudarão a entender e assumir a misericórdia também em nossos dias. No seu testamento, por exemplo, texto de grande valor para o carisma, o fundador narra com alegria a sua experiência diante dos excluídos do seu tempo e como tudo se transformou em doçura a partir do momento que ele agiu com misericórdia. O termo usado por Francisco "fiz misericórdia com eles" se entrelaça com a atitude daquele Samaritano da parábola que "fez misericórdia" Lc 10, 37 (“Qui fecit misericordiam”) e que Jesus pede para fazer o mesmo. O verbo aqui fazer junto com o substantivo misericórdia mostra a ênfase que antes de tudo a nossa vida antes de tudo, deve ser um constante ato de Misericórdia, deve ser um estilo de vida assim como foi na vida do jovem de Assis.
Vamos para outro texto escrito por Francisco e que nos fala agora sobre como esta misericórdia deve ser vivida com os irmãos. Destaco aqui o capítulo 7 da Regra Bulada e que ele fala "Da penitência a impor-se aos frades que pecam". Após falar com formalidade sobre qual deve ser a ação de quem pecar e a penitência que eles devem receber, ele enfatiza algo profundo e que deve estar acompanhado de toda ideia jurídica sobre o sacramento da confissão: "E devem cuidar de não se irar nem perturbar pelo pecado de alguém, porque a ira e a conturbação impedem a caridade em si e nos outros." Francisco sendo um homem arejado e como janelas abertas para o seu tempo, apresenta aos seus irmãos que o que deve reagir à vida dos frades menores também deve ser a misericórdia. Folheando este texto que é composto de 12 capítulos, não pode se passar indiferente a centralidade que este tema assume no texto, podendo ocupar como algo essencial dentro da Regra.
Um último texto que nos conduz a meditar sobre o tema da misericórdia na vida de nosso Pai Seráfico é uma carta do mesmo escrita a um Ministro. O santo enfatiza "se algum frade diante de algum pecado não buscar misericórdia, que tu lhe perguntes se quer misericórdia. E se depois pecasse mil vezes diante de teus olhos, ama-o mais do que a mim, para isto, para que o atraias ao Senhor; e que sempre tenhas misericórdia de tais [pessoas]." O texto composto por palavras de acolhimento e bondade nos dirige um olhar para a imagem do próprio Jesus que busca insistentemente por todos, amando incondicionalmente o pecador. A atitude do irmão que pecar deve ser livre assim também com atitude daquele que pode dar a misericórdia. Estas palavras dirigidas para um superior ressaltam ainda o quanto Francisco queria que aqueles que ocupassem um lugar de autoridade na ordem tivessem antes de tudo ações de amor para com seus irmãos.
Poderíamos continuar trazendo vários textos, citações que ressaltam esta temática, para continuar nossa reflexão neste dia em que lembramos o Perdão. Mas esses três trechos nos motivam a entender que antes de tudo Francisco viveu e queria que todos aqueles e aquelas que o seguissem fossem agentes da misericórdia de Deus para o mundo. Ao partir da Igrejinha da Porciúncula, os primeiros irmãos eram levados pelo mundo a pregar a Paz e a misericórdia (1Cel 12, 29). Diante da celebração do oitavo centenário da Regra Bulada não há como desviar o olhar e a atenção do quanto o regimento dos irmãos menores deve ter como pedra de toque e base o amor. A misericórdia perpassa todo o documento jurídico que tem como principal e centralidade o Evangelho a vida do jovem Galileu que abraçou os que ficavam à margem do caminho e chamou para participar de sua missão homens e mulheres que se deixaram tocar em suas misérias pela bondade de Deus.
Aos tantos e tantas que ainda hoje buscam seguir os passos de Francisco não tenhamos medo de ser uma Igreja aberta e acolhedora capaz de proporcionar a todos a experiência profunda com a misericórdia de Deus e assim todos possam testemunhar este amor sem limites e que ultrapassa qualquer medida.
Fonte: Frei Roberto Alves, OFM