SERMÃO DE SANTO ANTÔNIO: São Pedro e São Paulo
No último dia 2 de julho celebramos na Igreja do Brasil a Solenidade de São Pedro e São Paulo. Como grandes modelos de Apostolicidade e abertura a vontade de Deus, Santo Antônio escreveu alguns sermões sobre os dois santos. Apresentamos aqui um Sermão alegórico feito pelo santo português onde a partir do texto de Deuteronômio 33, 18-19, ele compara os patriarcas da fé como habitação de fortaleza e homem da recompensa.
Sermões
04.07.2023 10:19:59 | 5 minutos de leitura

9. "Alegra-te, Zabulon, na tua saída, e tu, Issacar, nas tuas tendas. Eles chamarão os povos para o monte; e aí imolarão vítimas de justiça. Eles chuparão como leite as inundações do mar" (Dt 33,18-19). Nesses dois patriarcas são representados os dois príncipes da Igreja Pedro e Paulo.
Zabulon, cujo nome interpreta-se "habitação da fortaleza", é figura do Bem-aventurado Pedro, que, depois da descida do Espírito Santo, tornou-se a habitação de tão grande fortaleza que, se antes havia negado o Senhor à voz de uma serva, depois não teve medo nem da espada [a crueldade] de Nero. "Pela palavra do Senhor tornaram-se firmes os céus", isto é, os apóstolos, "e pelo sopro de sua boca toda a sua fortaleza" (SI 32,6); e "Eu firmei suas colunas" (SI 74,4).
Issacar, cujo nome interpreta-se "homem da recompensa", é figura do Bem-aventurado Paulo, que foi verdadeiramente o homem da recompensa eterna, pela qual trabalhou mais do que todos os outros (cf. 1Cor 15,10). "Viu que o repouso era belo e que a terra era ótima, e dobrou o ombro e as costas para carregar o peso" (Gn 49,15): o evangelho sobre os ombros é o flagelo sobre as costas do amor ao próprio evangelho; e, portanto, a recompensa como prêmio. "Ai de mim se não evangelizar! Pelo que, se o faço de boa vontade, recebo a recompensa (1Cor 9,16-17). Diz Jó: "Escreva um livro aquele que me julga, para que eu o carregue sobre os meus ombros" Jó 31,35-36). Jesus Cristo, ao qual o Pai confiou todo o juízo (cf. Jo 5,22), escreveu o livro, isto é, o evangelho, que Paulo, vaso de eleição, carregou sobre os ombros diante dos povos, dos reis e dos filhos de Israel (cf. At 9,15), pelos quais foi ferido três vezes com açoites e uma vez foi apedrejado pelo nome de Cristo (cf. 2Cor 11,25).
10. Esses dois apóstolos foram, hoje, alegres em seu martírio. Pedro "na sua saída". pelo suplício da cruz para a glória da eterna bem-aventurança; Paulo "nas tendas" saindo da tenda do seu corpo e entrando na tenda da habitação celeste. Pedro está alegre com a cruz, Paulo, com a espada, porque estão certos da eterna recompensa, para a qual, enquanto estavam em vida, haviam chamado os povos a eles confiados.
"Chamarão os povos para o monte." Lemos no Livro dos Números: "O Senhor falou a Moisés dizendo: Faze duas trombetas de prata batida, com as quais poderás reunir a multidão" (Nm 10,1-2). Esses dois apóstolos são chamados trombetas de prata pela grande ressonância de sua pregação; " de prata batida" porque sofreram o martírio. Essas duas trombetas foram feitas por Cristo, isto é, escolheu-as com sua graça e, por meio delas, chamou a multidão dos povos para o monte da vida eterna. E como as trombetas de Moisés reuniam o povo para a guerra, para os banquetes sagrados e para as solenidades (cf. Nm 10,9-10), assim esses dois apóstolos chamaram os povos para a guerra contra os vícios. Diz Pedro: "Sede sóbrios e vigiai, porque o vosso inimigo, o diabo, como um leão a rugir, anda em volta procurando a quem devorar" (1Pd 5,8). E Paulo: «Tomai o escudo da fé, com o qual possais repelir e apagar todos os dardos de fogo do maligno" (Ef6,16).
Convidaram para o banquete da inocência e da vida santa. Pedro: "Como meninos recém-nascidos, desejai o puro leite espiritual, para que por ele cresçais para a salvação: se é que haveis provado quão doce é o Senhor" (1Pd 2,2-3). E Paulo: "Banqueteemo-nos nos ázimos da sinceridade e da verdade" (1Cor 5,8).
Convidaram para a grande festa da pátria celeste. Pedro: "Exultareis com uma alegria inefável e cheia de glória, alcançando o fim da vossa fé, a salvação das vossas almas" (1Pd 1,8-9). E Paulo: "Correi também vós de maneira a conquistar o prêmio" (1Cor 9,24); e de novo: "Até chegarmos todos ao estado de homem perfeito, segundo a medida da idade da plenitude de Cristo" (Ef4,13).
E depois que essas trombetas, esses dois apóstolos, chamaram os povos aos três compromissos indicados, ouçamos o que eles próprios fizeram. "E imolarão sacrificios legítimos" (lit. vítimas de justiça). É o que fizeram hoje, imolando a Cristo, com O martírio, seus corpos como vítimas de justiça, porque eram justos e santos.
11. E quão doce foi para eles a amargura do martírio, é dito claramente: "Chuparão como leite as inundações do mar». Observa que o mar que irrompe sobre a terra é de aspecto espantoso e de gosto amargo; ao contrário, o leite é de cor agradável e de sabor doce. E na palavra "chuparão" são postos em evidência o desejo e o prazer.
Ó amor de Cristo, que tornas doce toda a amargura! O martírio dos apóstolos foi espantoso e amaríssimo, mas o amor de Cristo o tornou agradável e doce, tanto que o procuraram com impaciência e o acolheram com alegria, e, assim, foram considerados dignos de gozar para sempre, junto com aquele que é bendito nos séculos eternos. Amém.
Fonte: Sermões | Santo Antônio; tradução de Frei Ary E. Pintarelli, OFM: Vozes, 2019