SERMÃO DE SANTO ANTÔNIO: Quarta feira de Cinzas

Acompanhe um Sermão de Santo Antônio sobre a Quarta feira de Cinzas. A partir dos textos Mt 6,16-17 e Mt 6,2-3, o frade ressalta o real significado do jejum e a esmola.

21.02.2023 08:37:03 | 14 minutos de leitura

 SERMÃO DE SANTO ANTÔNIO: Quarta feira de Cinzas

        1. Jesus disse a seus discípulos: Quando jejuais não vos mostreis tristes como os hipócritas que desfiguram o rosto para mostrar aos homens que jejuam.., unge antes a cabeça e lava o rosto etc. (cf. Mt 6,16-17). Quando deres esmola, não faças tocar a trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas não saiba a tua esquerda o que faz a tua direita etc. (cf. Mt 6,2-3). Neste trecho evangélico são tratados dois assuntos: o jejum e a esmola.

I - O JEJUM

        2. "Quando jejuais." Nesta primeira parte devem-se considerar quatro coisas: o fingimento dos hipócritas, a unção da cabeça, a lavação do rosto, o ocultamento do bem. "Quando jejuais." Na História natural, lê-se que com a saliva do homem em jejum resiste-se aos animais venenosos: e até, se uma serpente a ingerir, ela morre (PIínio). Portanto, no homem em jejum existe verdadeiramente uma grande medicina.

        No paraíso terrestre, enquanto jejuou do fruto proibido, Adão se manteve na inocência. Eis a medicina que mata a diabólica serpente e que restitui o paraíso, perdido por culpa da gula. Por isso, diz-se que Ester castigou seu corpo com os jejuns para fazer cair o orgulhoso Aman e reconquistar para os judeus a benevolência do Rei Assuero (cf. Est 4). Jejuai, pois, se quiserdes conseguir estas duas coisas: a vitória sobre o diabo e a restituição da graça perdida. Mas,"quando jejuardes não vos torneis tristes como os hipócritas" (Mt 6,16), isto é, não mostreis o vosso jejum com a tristeza do rosto: não proíbe a virtude, mas a falsa aparência da virtude...

        Hipócrita diz-se também "dourado", isto é, que tem a aparência do ouro, mas no interior, na consciência, é lodoso. Este é Bel (Bal), o ídolo dos Babilônicos, do qual Daniel diz: "Não te enganes, ó rei, este ídolo é de barro por dentro e de bronze por fora" (Dn 14,6).

        O bronze ressoa e pelo aspecto pode quase parecer ouro. Assim o hipócrita ama o som do louvor e ostenta uma aparência de santidade. O hipócrita é humilde no rosto, modesto na veste, submisso na voz, mas lobo na sua mente.

        Esta tristeza não é segundo Deus. É uma maneira estranha de conseguir o louvor, essa de ostentar os sinais da tristeza. Os homens costumam alegrar-se quando nos outros a falsidade. ganham dinheiro. Mas se trata de negócios diferentes: nestes últimos existe a vaidade,

        "Desfiguram-se [latim: exterminant ] o rosto" (Mt 6,16), isto é, aviltam-se além dos limites (extra terminos) da condição humana. Assim como pode gabar-se do luxo das vestes, pode-se fazê-lo também da miséria e da macilência. Não se deve abandonar-se nem a uma miséria exagerada, nem a um excessivo requinte: é bom manter o justo equilíbrio.

        "Para mostrar aos homens.." Qualquer coisa que façam, é aparência, pintada com cores falsas. Comenta a Glosa: Fazem-no para parecerem diferentes dos outros e serem chamados super-homens, até pelo aviltamento.

        "….que jejuam" (Mt 6,16). O hipócrita jejua para receber o louvor, o avarento para encher a bolsa, o justo para agradar a Deus. "Em verdade vos digo: já receberam sua recompensa" (Mt 6,16). Eis a recompensa do prostíbulo, do qual diz Moisés: "Não prostituas tua filha" (Lv 19,29). A filha representa as suas obras, que põem no prostíbulo do mundo para receber a recompensa do louvor. Seria louco quem vendesse por uma moeda de chumbo uma preciosa moeda de ouro. Mas vende por um preço vilíssimo uma coisa de grande valor quem faz o bem para ter o louvor dos homens.

        3. "Tu, porém, quando jejuas, unge a cabeça e lava o rosto" (Mt 6,17). Isso está de acordo com o que diz Zacarias: "Isto diz o Senhor dos exércitos: O jejum do quarto, o jejum do quinto, o jejum do sétimo, o jejum do décimo mês converter-se-á para a casa de Judá em gozo e alegria e em festivas solenidades" (Zc 8,19).

        "Casa de Judá" interpreta-se "que manifesta" ou "que louva", e representa os penitentes que manifestando e confessando seus pecados dão louvor a Deus. Destes é, e deve ser, o jejum do quarto mês, porque jejuam (se abstêm) de quatro pecados: da soberba do diabo, da impureza da alma, da glória do mundo, da injúria ao próximo. "Este é o jejum que eu amo", diz o Senhor (Is 58,6).

        O jejum do quinto mês consiste em preservar os cinco sentidos das distrações e dos prazeres ilícitos. O jejum do sétimo mês é a repressão da cobiça terrena: de fato, como se lê que o sétimo dia não tem fim, da mesma forma nem a cobiça do dinheiro toca o fundo da suficiência.

        O jejum do décimo mês consiste em abster-se de perseguir um objetivo mau. O 10 marca o fim de cada número, e quem quer contar adiante deve recomeçar do 1. O Senhor se lamenta por boca de Malaquias: "Vós me tendes ultrajado, e me dissestes: Em que te ultrajamos nós? Nos dízimos e nas primícias» (MI 3,8), isto é, no mau objetivo e no início de uma intenção perversa. E presta atenção, que põe os dízimos antes das primícias, porque é sobretudo pelo fim perverso que é condenada toda a obra precedente. Este jejum transforma-se para os penitentes em gozo da mente, em alegria do amor divino e em esplêndida solenidade de celeste conversação.

        Isso quer dizer ungir a cabeça e lavar o rosto. Unge a cabeça aquele que no seu interior está cheio de alegria espiritual; lava o seu rosto aquele que orna suas obras com a honestidade da vida.

        4. Outro sentido. "Tu, porém, quando jejuas.." São muitos aqueles que jejuam nesta quaresma e, todavia, persistem nos seus pecados. Estes não ungem sua cabeça. Observa que existe um tríplice unguento: o lenitivo (sedativo), o corrosivo c o pungitivo (pungente). O primeiro é produzido pelo pensamento da morte, o segundo pela presença do futuro Juiz, o terceiro pela geena.

        Existe a cabeça coberta de pústulas, de verrugas e de impetigem. A pústula é uma pequena protuberância superficial, cheia de podridão (pus); a verruga é uma excrescência de carne supérflua, motivo porque verrugoso pode significar também "supérfluo"; a impetigem é uma sarna seca, que deturpa a beleza. Nestas três enfermidades são indicadas a soberba, a avareza e a luxúria obstinada.

        Tu, ó soberbo, censura aos olhos de tua mente a corrupção do teu corpo, a podridão e o fedor que exalará. Onde estará então aquela tua soberba do coração, aquela tua ostentação de riquezas? Então, já não existirão as palavras cheias de vento, porque a bexiga se esvazia a uma mínima picada de agulha. Estas verdades, meditadas no íntimo, ungem a cabeça pustulenta, isto é, humilham a mente orgulhosa.

        E tu, ó avaro, lembra-te do último exame, onde estará o Juiz desdenhado, estará o carrasco pronto a atormentar, estarão os demônios que acusam e a consciência que tortura. Então tua prata será jogada fora, o ouro tornar-se-á imundície; o teu ouro e tua prata não poderão libertar-te do dia da ira do Senhor (cf. Ez 7,19). Estas ver-dades, meditai com atenção, consumam e separam as verrugas da superfluidade, e as dividem entre aqueles que não têm nem o necessário. Por isso, quando jejuas - eu te esconjuro - unge tua cabeça com este unguento, a fim de que aquilo que tiras de ti mesmo seja dado ao pobre.

        Também tu, ó luxurioso, pensa na geena do fogo inextinguível, onde haverá morte sem morte, fim sem fim; onde se procura a morte, mas não se encontra; onde os condenados comer-se-ão a língua e maldirão seu Criador. Lenha daquele fogo serão as almas dos pecadores e o sopro da ira de Deus as incendiará. Diz Isaías: "Há muito tempo [isto é, desde a eternidade] está preparado o lugar de Tofet [a geena de fogo], profundo e espaçoso. Fogo e lenha abundarão; o sopro do Senhor a acenderá como uma torrente de enxofre" (Is 30,33). Eis o unguento que pica, que penetra, capaz de sanar a mais obstinada luxúria. Como prego amassa prego, assim estas verdades, meditadas assiduamente, estão em condições de reprimir os estímulos da luxúria. Portanto, tu, quando jejuas, unge a cabeça com este unguento.

        5. "Lava o rosto." Quando querem sair em público, as mulheres colocam-se diante do espelho e, se descobrem alguma mancha em seu rosto, lavam-no com água. Assim também tu, olha no espelho de tua consciência e se ali encontrares a mancha de algum pecado corre imediatamente para a fonte da confissão. Quando, na confissão, se lava com as lágrimas o rosto do corpo, também o rosto da alma é limpo e iluminado.

        Deve-se observar que as lágrimas são luminosas contra a obscuridade, são quentes contra o frio, são salgadas contra o fedor do pecado. "Para que os homens não vejam que jejuas." Jejua para os homens quem procura seu aplauso. Jejua para o Senhor quem se mortifica por seu amor e dá aos outros aquilo que subtrai a si mesmo. "Mas só o teu Pai que está presente ao secreto" (Mt 6,18). Acrescenta a Glosa: O Pai está no secreto, isto é, no íntimo, por meio da fé, e recompensa aquilo que é feito em segredo. Portanto, deve-se jejuar no segredo, para que só ele veja. E é necessário que quem jejua, jejue de maneira a dar prazer àquele que leva no seio. Amém.

II - A ESMOLA

        6. "Não acumuleis tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem os consomem, e onde os ladrões arrombam e roubam" (Mt 6,19).

        A ferrugem consome os metais, a traça, as vestes; o que se salva destes dois flagelos, é roubado pelos ladrões. Com estas três expressões é condenada qualquer forma de avareza. Veremos o significado moral das cinco palavras: terra, tesouros, ferrugem, traça e ladrões.

        A terra, assim chamada porque se disseca (latim: torret) pela secura natural, representa a carne, que é tão sedenta que nunca se sacia. Os tesouros são os preciosos sentidos do corpo. A ferrugem, doença do ferro, assim chamada por corroer, indica a ambição que, enquanto agrada, destrói o esplendor da alma e a consome. A traça, assim chamada porque "tem", indica a soberba ou a ira. Os ladrões (latim: fures, de furvus: obscuro), que trabalham na obscuridade da noite, representam os demônios.

        Portanto, se nos comportamos segundo a carne, escondemos os tesouros na terra, quer dizer que, enquanto ocupamos os preciosos sentidos do corpo nos desejos terrenos ou da carne, a ferrugem, isto é, a ambição, os consome. Além disso, a soberba, a ira e os outros vícios destroem a veste dos bons costumes, e se ainda sobrar alguma coisa os demônios a roubam, pois estão sempre atentos exatamente a isso: despojar dos bens espirituais.

        "Acumulai tesouros no céu" (Mt 6,20). Grande tesouro é a esmola. Lourenço disse: As riquezas da Igreja foram recolocadas no tesouro celeste pelas mãos dos pobres. Acumula tesouros no céu quem dá a Cristo. Dá a Cristo quem dá ao pobre: O que tiverdes feito a um destes meus irmãos menores, a mim o fizestes (cf. Mt 25,40).

        "Esmola" é um termo grego: em latim é misericórdia. Misericórdia significa "que rega o mísero coração" (miserum rigans cor). O homem rega a horta para tirar dela os frutos. Rega também tu o coração do pobre miserável com a esmola, que é chamada a água de Deus, para receber dela o fruto na vida eterna. O teu céu seja o pobre; nele repõe o teu tesouro, a fim de que nele esteja sempre o teu coração, e isto sobretudo durante esta Santa Quaresma.

        E onde estiver o coração ali está também o olho; e onde estiverem o coração e os Olhos, ali está também o intelecto, do qual diz o salmo: "Bem-aventurado o que cuida (intelligit, compreende, tem cuidado) do necessitado e do pobre" ($1 40,2). E Daniel disse a Nabucodonosor: "Portanto, segue, ó rei, o conselho que te dou e resgata os teus pecados com esmolas e as tuas iniquidades com obras de misericórdia para com os pobres" (Dn 4,24).

        Muitos são os pecados e as iniquidades, e por isso muitas devem ser a esmolas e as obras de misericórdia para com os pobres: resgatados com elas da escravidão do pecado, possais retornar livres à pátria celeste. Vo-lo conceda aquele que é bendito nos séculos. Amém.

II - SERMÃO MORAL

        7. Lê-se no Livro dos Juízes que Gedeão conquistou os acampamentos de Madiã com lucernas, trombetas e ânforas (cf. Jz 7,16-23). Também Isaías diz: "Eis que o Dominador, o Senhor dos exércitos, quebrará o vaso de terra com ímpeto, os de estatura agigantada serão cortados e os grandes serão abatidos. As espessuras do bosque serão derrubadas pelo ferro; o Líbano cairá com os seus altos cedros" (Is 10,33-34).

        Vejamos que significado moral têm Gedeão, a lucerna, a trombeta e a ânfora.

        Gedeão interpreta-se "que gira no útero", e indica o penitente que, antes de aproximar-se da confissão, deve girar no útero de sua consciência, na qual é concebido e gerado o filho da vida ou da morte. [Deve pensar] na sua idade, em quantos anos podia ter quando começou a pecar mortalmente, e depois quantos e que pecados mortais cometeu e quantas vezes; quais foram os lugares, quais os tempos; se pecou privadamente ou em público, se foi constrangido, se antes foi tentado ou se pecou antes mesmo de ser tentado, o que é muito mais grave.

        E se iá se confessou de todas estas coisas; e se, depois de se ter confessado, recaiu nos mesmos pecados, e quantas vezes; porque neste caso foi muito e muito mais ingrato à graça de Deus. Se descuidou da confissão e por quanto tempo permaneceu em pecado sem se confessar; e se em pecado mortal recebeu o corpo do Senhor.

        Desse giro de busca fala-se no Primeiro livro dos Reis: "Samuel julgou Israel durante todos os dias de sua vida. E ia todos os anos dando volta a Betel, a Guilgal e a Masfa. Depois voltava para Ramá, porque estava ali a sua casa" (1Sm 7,15-16). Samuel interpreta-se "que ouve o Senhor", Betel "casa de Deus", Guilgal "colina da circuncisão", Masfa "que contempla o tempo", Ramá "vi a morte". Portanto, o penitente, ouvindo o Senhor que diz "fazei penitência" (Mt 3,2), deve julgar a si mesmo por todos os dias de sua vida, para ver se ele é Israel, isto é, se é alguém que vê a Deus.

        Cada ano, durante esta quaresma, deve examinar a própria consciência, que é a casa de Deus e tudo aquilo que encontrar de nocivo ou de supérfluo deve circuncidá-lo na humildade da contrição; e deve considerar também o tempo passado, procurando diligentemente o que cometeu, o que omitiu e, depois disso tudo, retornar sempre ao pensamento da morte, que deve ter diante dos olhos, ou melhor, neste pensamento deve morar.

        8. O penitente, atento explorador, tendo feito assim o giro, deve logo acender a lâmpada que arde e ilumina (cf. Jo 5,35); nela é indicada a contrição, a qual, pelo fato de arder, por isso, também ilumina. De fato, diz. Isaías: «A luz de Israel estará naquele fogo e o seu Santo na chama que abrasará e devorará os seus espinhos e os seus abrolhos em um só dia. A magnificência de seu bosque e do seu Carmelo será consumida desde a alma até a carne" (Is 10,17-18).

        Eis o que faz a verdadeira contrição. Quando o coração do pecador se acende com a graça do Espírito Santo, queima pela dor e ilumina pelo conhecimento de si mesmo; e então, os espinhos, isto é, a consciência cheia de tribulações e de remorsos, e os abrolhos, quer dizer, a tormentosa luxúria, tudo é destruído, porque no interior e no exterior é refeita a paz. E a magnificência do bosque, isto é, o luxo deste mundo, e do Carmelo, que se interpreta "mole", isto é, a dissolução carnal, são extirpados da alma até a carne, pois tudo o que existe de imundo, tanto na alma quanto no corpo, é consumido pelo fogo da contrição.

        Feliz aquele que queima e ilumina com esta lâmpada, da qual diz Jó: "Lâmpada desprezada no pensamento dos ricos, preparada para o tempo estabelecido" (Jó 12,5). Os pensamentos dos ricos deste mundo são: guardar as coisas conquistadas e suar para conquistar outras; e por isso raramente, ou nunca, encontra-se neles a verdadeira contrição; eles a desdenham porque fixam o espírito nas coisas transitórias. De fato, enquanto perseguem com muito ardor o prazer das coisas temporais, esquecem a vida da alma, que é a contrição, e assim vão ao encontro da morte.

        Diz a História natural que a caça ao cervo se faz dessa maneira. Dois homens partem, e um deles assobia e canta: então o cervo segue o canto porque é atraído por ele; enquanto isso, o segundo lança a flecha, acerta-o e o mata. Do mesmo modo é feita a caça aos ricos. Os dois caçadores são o mundo e o diabo. À frente do rico, o mundo assobia e canta, porque lhe mostra e lhe promete os prazeres e as riquezas; e enquanto aquele insensato o segue encantado, porque ele encontra prazer naquelas coisas, é morto pelo diabo e levado para a cozinha do inferno para ali se cozido e assado.

        9. Mas eis finalmente o tempo da quaresma, instituído pela Igreja para expiar os pecados e salvar as almas: nele é preparada a graça da contrição, que agora está espiritualmente à porta e bate; se quiseres abrir-lhe e acolhê-la, ela há de cear contigo e tu com ela (cf. Ap 3,20). E então começarás a tocar a trombeta de modo maravilhoso.

            A trombeta é a confissão do pecador contrito. Dela diz-se no Êxodo: "Todo o Monte Sinai fumegava, porque o Senhor tinha descido sobre ele no meio do fogo. E dele, como duma fornalha, elevava-se fumo, e todo o mundo causava terror. O som da trombeta ia aumentando pouco a pouco, e se espalhava mais ao longe" (Ex 19,18-19)        .

           Estas palavras descrevem como deve comportar-se o pecador na sua confissão. O monte é chamado assim porque não se move. O Monte Sinai, nome que se interpreta "Os meus dentes", representa o penitente, forte e intrépido no tempo da tentação, que, com os dentes, isto é, com os castigos que se inflige, lacera suas carnes, quer dite suas tendências carnais. Ele fumega todo pelas lagrimas que soem da fornalha da contrição: e isso provém da descida da graça celeste.

        "E todo o monte incutia terror" , porque o penitente tem as lágrimas e a tristeza no rosto, a pobreza nas vestes, a dor no coração e os suspiros na voz.

        "E o som da trombeta, isto é, da confissão, pouco a pouco fazia-se mais forte e insistente" etc. Aqui é indicado o modo de confessar-se. O início da confissão deve começar pela acusação de si, como passou da sugestão ao prazer, do prazer ao com. senso, do consenso à palavra, da palavra à ação, da ação à repetição do pecado, da repetição ao hábito.

        Comece primeiramente pela luxúria, por todas as suas modalidades e circunstâncias, segundo a natureza e contra a natureza. Depois pela avareza, usura, furto e rapina e por todo o roubado, que é obrigado a restituir se tiver a possibilidade disso.

        Depois, se é clérigo, comece pela simonia, e se recebeu as ordens enquanto estava excomungado, ou se as exerceu, ou se ao recebê-las cometeu alguma irregularidade. Enfim, poderá confessar-se de todas as outras coisas, como melhor parecer ao penitente e ao confessor.

1        0. Feita a confissão, deve ser imposta a penitência (satisfação), que é indicada pelo rompimento da ânfora ou do vaso de terra cozida. O vaso é quebrado, o corpo é feito sofrer; Madiã, que se interpreta "pelo juízo" ou "iniquidade", isto é, o diabo, que pelo juízo de Deus já está condenado, é derrotado e sua iniquidade anulada.

        E é exatamente isso que diz Isaías: "Os de estatura agigantada", isto é, os demônios, "serão cortados", "e os poderosos" isto é, os homens soberbos, "serão humilhados, e as espessuras do bosque", , isto é, a abundância das coisas temporais, "será destruída pelo ferro" do temor de Deus; "e o Líbano, isto é, o esplendor do luxo mundano, "com seus altos cedros", isto é, as nulidades, as trapaças e as aparências, "tudo cairá" (Is 10,33-34).

        Presta atenção, que a satisfação, isto é, a penitência, consiste em três coisas: na oração por aquilo que se refere a Deus, na esmola por aquilo que se refere ao próximo e no jejum por aquilo que se refere a si mesmo, a fim de que a carne, que no prazer levou ao pecado, na expiação e no sofrimento conduza ao perdão.

Digne-se no-lo conceder aquele que é bendito nos séculos. Amém.

Fonte: Sermões | Santo Antônio; tradução de Frei Ary E. Pintarelli, OFM: Vozes, 2019
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